domingo, 7 de dezembro de 2008

filatelia

“PÊRA DE SATANAZ”

Quem goste de estudar compêndios de filatelia, sobretudo estrangeiros, poderá encontrar referências a falsificadores que, quase do princípio, se dedicaram a aproveitar-se da boa fé dos coleccionadores de selos postais.
Os que mais se mencionam, são precisamente, os que tinham o objectivo direccionado para os filatelistas, entre outros de fama justificada, como os irmãos Spiro de Hamburgo, François Fournier, ou Jean de Separati, que se ufanava de poder apresentar falsificações, que enganariam qualquer expert.
Porém, houve falsificadores, que se dedicaram a fazer selos postais, cujo objectivo era o de obter, naturalmente, grandes somas, defraudando os serviços de correios.
Houve em Portugal um desses falsificadores, cuja fama, se liga com a filatelia. Tratou-se de Alfredo Alves Mendes, mais conhecido como “Pêra de Satanaz”, de que se faz referência nos catálogos de selos de Portugal, por o selo de 25 réis em cor castanha, com a imagem frontal de D. Luís (catálogo Afinsa, número 57), numa variante falsa, que como se verá, foi um mestre profissional de falsificações.
Esta variante designada por “Pêra de Satanaz”, distingue-se facilmente dos verdadeiros, pelo seu denteado irregular e imperfeito e ainda pela sua pouco cuidada impressão.
Demais a referência a este falsificador português, natural do Porto, pelo que tenho visto, nunca uma publicação filatélica se terá ocupado da personagem, de modo que, será interessante conhecer da sua actividade criminosa do homem, que a mencionada estampilha imortalizou.
Alfredo Mendes Alves, o “Pêra de Satanaz” de facto, inquilino frequente de cadeias, donde algumas vezes se evadiu.
Condenado por vários roubos no Porto e em outras localidades do norte, chegou a ter cela fixa na Azambuja, onde esteve preso por falsificar bilhetes de lotaria.
Veio a ser condenado, de novo põe actividades ilícitas em Lisboa e Madrid em 1868. Fugiu e voltou a ser capturado, cumprindo mais um ano de pena.
Dedicou-se então a falsificar moedas, o que lhe valeu uma condenação de cinco anos de desterro no Ultramar. Uma apelação fez com que o preso viesse estacionar na penitenciária do Limoeiro, a aguardar resolução definitiva.
Definitivamente, não tinha paciência para grandes esperas. Foi assim que, em 31 de Dezembro de 1880, protagonizou uma fuga espectacular. Foi apanhado em Viseu e depois de um ano de desterro em África, regressou a Lisboa.
Apareceram depois novas moedas de 500 Réis, a cuja origem fraudulenta se aliou um comissário de polícia, uma vez mais, até 12 Maio de 1886, “Pêra” só pôde ver através das grades aos quadradinhos.
Por fim, chego aos selos, ainda em 1886, “Pêra de Satanaz” voltou ao presídio do Limoeiro, onde foi de visita a um jovem de 17 anos, que cumpria uma leve condenação. Tratava-se dum empregado da Casa da Moeda.
O motivo da visita era a de conseguir um acordo, que o falsificador delineara, enquanto incutia bons ensinamentos.
Depois de escolher meticulosamente todos os colaboradores e quando considerou, que o ingénuo jovem estava bastante preparado, como peça fundamental do seu plano, pôs mãos à obra. Obteve assim clandestinamente, as pranchas dos selos de 25 réis (também as do 500 réis).
O papel procedeu de mesma fonte. Adquiriu uma máquina de impressão Minerva, por 20 escudos, num estabelecimento da Praça Camões, em Lisboa.
Necessitava de tudo isto para produzir selos em série, que iriam competir com os do Serviço de Correios.
Então precisava de um sistema de vendas, que não chamasse a atenção das autoridades. Dessa tarefa se encarregou um tal Caetano Simões, um rapaz empregado de padaria, que apodavam de “o Abade”.
Timidamente, as estampilhas apareceram nas imediações de Lisboa, mas pouco a pouco começou a notar-se a sua proliferação. As razões para justificar a venda eram plausíveis:
- “O Abade” tinha recebido selos de correio, que lhe tinham sido enviados por um amigo, de África em pagamento de algo e não tinha correspondência suficiente, para os gastar todos. Estava disposto a perder dinheiro, vendendo-os por junto.
Até ao exame periódico às pranchas, na Casa da Moeda, os falsos selos impressos com as autênticas foram inundando o mercado.
Foi a desaparição das pranchas, que alertou os Serviços do Correio e em consequência as autoridades.
Depois de vigiar com toda a cautela o “Pêra de Satanaz” e de seguir os cúmplices, estendeu-se a rede. O primeiro a cair foi o “Abade”, que acabou por confessar a trama.
Isto fez com que o falsificador, acabasse com ossos na cadeia, para cumprir a última pena, uma vez que, quando saiu da penitenciária, foi para o Hospital de S. José, onde acabou os seus dias.

Daniel Costa – fez o estudo, publicado em espanhol, na revista “Crónica Filatélica”, da Afinsa de Madrid número, 116 de Novembro de 1994.

1 comentário:

xistosa, josé torres disse...

Sempre ouvi falar em falsificadores de selos.
Nunca tinha lido nada sobre nenhum.
Aguçou-me o apetite.
Andei a investigar e li coisas lindas.
Deixo-lhe um bocado que foi seu:


"MUNDO DA FILATELIA
EÇA DE QUEROZ NO BRASIL
Visto que a língua portuguesa é uma das mais faladas no mundo, é natural que encontremos bastantes cultivadores dos seus selos, para além do rectângulo Ibérico, mesmo se pusermos de parte o Brasil e os novos PALOPS.
O Brasil onde aparecem extraordinárias figuras da literatura, os periódicos, os livros, a rádio ou a televisão, que honram e fazem, cada vez mais versátil a língua lusa.
Não causa estranheza, pois, ter havido neste imenso país, o lançamento, em 21 de Outubro de 1995, de uma série de três selos denominada – LITERATURA – tendo Carlos Drummond de Andrade e Ruben Braga, o grande cronista, repórter, editorialista, poeta, tradutor ambos brasileiros. Apareça junto outra grande figura portuguesa da novelística, do conto, da crónica, da crítica literária e da epistolografia, José Maria Eça de Queiroz.
Isto porque, aparte de se haverem cumprido da 150 anos da morte do escritor, foi um dos maiores expoentes da literatura de língua portuguesa. Segundo João Gaspar Simões, foi ele que deu à literatura de Portugal e do Brasil a sua fluidez e maleabilidade actual.
Bom é que, na realidade, que os filatelistas dedicados a selos que falam de Portugal e da sua história tenham conhecimento desta emissão brasileira. Não deixa de contribuir também para marcar as boas intenções postas, no relacionamento da amizade cultural entre as duas nações irmãs.
Para terminar, podemos adiantar que os selos do Brasil podem encontrar-se nas boas casas filatélicas de Lisboa e Porto.

O texto foi escrito, por Daniel Costa, para a revista Crónica Filatélica, que a Afinsa publicava em Madrid. Saiu no número 129, de Janeiro de 1995.

Daniel Costa""