HISTÓRIAS DE AMOR QUE NÃO CONTEI
No último ano de século passado, depois de grande AVC
– Acidente Vascular cerebral, pelo hospital fui entregue à família em semi coma,
em estado dito, terminal.
Seria assim menos um bom rapaz a cruzar-se com a irmã
morte, naquela unidade hospitalar.
Estive naquele estado, cerca de quatro meses.
Nesses tive espaços de tempo de lucidez.
No entanto tinha regredido e como na adolescência me
preocupei muito com amores. Sem sorrir nunca me senti triste, mas meus deuses –
Com quem casaria, se não tinha namorada!
Numa dessas lucubrações, a filha questionou-me assim:
- “pai mas nas não casaste com a mãe”?
Fez-se então luz no meu espírito, deixei de me
preocupar a esse espectro.
Ficava então livre de quaisquer motivos de preocupação.
Outros sonhos podiam continuar.
Possíveis tristezas ou dissabores estavam arredadas.
Contra tudo e todos, pensava, ainda viveria dez anos.
Por vezes era o passado, que passava na mente, em
jeito de fita cinematográfica, onde os velhos amores se destacavam.
De facto, mercê de usufruir do estatuto de trabalhador
estudante, fui subindo bastante na vida, o que deu origem a várias revolução
amorosas, a condizer mais com as novas posições sociais, que iam sendo tomadas.
Vou referir dois casos:
- Em determinada altura, trocas de olhares, nas aulas
do liceu, resultaram em namoro. A miúda era bastante interessante. A princípio
achei que tinha feito a última conquista amorosa da vida.
A breve trecho, ela me telefonava todos os dias, para
lhe esclarecer dúvidas sobre todas as lições recebidas na aula. Depressa vi
que, a minha nova namoradinha, era um cepo mental.
Porém o namoro continuou, passamos a nos encontrar em
deambulações noctívagas pela cidade. Os tempos eram outros e beijar era um caso
muito sério.
Tinha até já ouvido, a uma grande senhora a seguinte
frase: “quem beija faz o resto”.
Dado o andarmos tardiamente nas ruas da cidade, quando
já não se via viva alma. Eu ia pedindo
um beijo que sempre foi negado até que lho roubei.
- O que fiz?
A garota desatou a chorar, como se fosse desabar o
mundo. Senti-me culpado e julguei que ia ali acabar o namoro.
Mas não, no entanto beijar nunca mais, mas ficaria com
a hipótese de ser eu a vir a acabar.
Aconteceram mais alguns encontros noctívagos. Era
hábito, levá-la à porta de casa.
Em determinada ocasião, eram cerca de onze horas da
noite, passávamos à porta de familiares seus, ela deixando-me na rua, a olhar
para a lua, disse: “espera um pouco, vou visitar os meus primos volto já”.
Tanto bastou para eu zarpar. Telefonou depois, para me
ouvir – o namoro acabou!
Depois de vários, namoros, veio o último.
À época a trabalhar num escritório de zincogravuras. A
casa tendo cerca de quarenta empregados, nenhum era do sexo feminino, portanto dali ideias de namoros não podiam sair.
Como tinha já arreigada a ideia de procurar a
perfeição e era considerado, podia fazer horas extras a meu talante. Assim, até
nas duas horas de almoço, à excepção de quinze minutos, trabalhava.
Funcionava a verdadeira Internet desse tempo, a revista
PLATEIA, da conceituada Agência Portuguesa de Revistas.
Como dispunha de pouco tempo, seguindo bastantes
exemplos, coloquei anúncio na secção de namoros.
Dentre as várias respostas, seleccionei uma.
Namorei a escolhida, de acordo com ela viemos a trocar
um beijo às escondidas, exactamente numa galeria do metropolitano. Ficou o
caminho aberto para mais outros, sempre às escondidas, até ao matrimónio,
segundo os ritos da Santa Madre Igreja.
Em vários namoros, mãos dadas, era sempre fruto
proibido.
Devo mencionar a figura do “pau-de-cabeleira”, que
acompanhava sempre os pombinhos, não fossem os mesmos perderem-se.
Sobretudo no último namoro fui eu, pobre de mim, a
pagar três bilhetes por sessão.
Outros tempos, no século passado!...
Daniel Costa